sábado

Democracia, governação e redes sociais


Nunca como hoje em toda a Europa, com predominância no sul do velho continente, o anel de democracia, governação e redes sociais foi tão intimo e explosivo. Na base desta interdependência complexa está, naturalmente, o agravamento das condições de vida das populações em Portugal, Espanha, Grécia, Itália e na generalidade dos países da Europa - que também já não encontram no projecto europeu, nos seus líderes, políticas e instituições o cimento solidarista, cooperativo e desenvolvimentista doutros tempos. Hoje, consabidamente, a Europa da decisão resume-se, tristemente à Alemanha da srª Merkel - essa personagem dantesca e cifrónica que olha para a Europa como um imenso mercado exportador para a Alemanha vender os seus produtos e serviços e exportar as suas tecnologias. Alemanha que goza hoje duma situação de quase pleno emprego, é uma ilha na Europa, ombreando com os países encandinavos.  
Sucede, porém, que o mundo não se confina às finanças e à economia, há sonhos e projectos pessoais por cumprir. Há pessoas e famílias que têm que comer diariamente, e a democratização da vida em sociedade, a igualização da comunicação dos utilizadores nas redes sociais dá a ideia clara a esses milhões de ciber-utilizadores das redes sociais que o seu conceito de cidadania se alargou, potenciou o seu poder pela lei do  número e da capacidade quase imediata que as pessoas têm em se mobilizar e organizar para reclamar os seus legítimos direitos; criticarem as políticas públicas seguidas; a draconiana carga fiscal. Enfim, para eliminar as condições de toda uma governação económica que se financia maioritariamente à custa da classe média e média baixa e não, como devia, no lado da despesa do Estado e nas suas famosas gorduras, de que as PPPs são o mais vergonhoso exemplo, além do buraco criminoso que é o BPN.
Portanto, as pessoas que vão para as ruas manifestarem-se, de diferentes formações e origens sociais e de distintas gerações, são as pessoas que já se consciencializaram do poder que têm e de que têm que o usar pacificamente para obrigar o Governo a recuar em certas políticas. A TSU foi disso exemplo, ou seja, a inteligência da acção colectiva pôs-se em campo e condicionou o poder e o seu exercício, obrigando até Belém a agendar um Conselho de Estado extra-ordinário para avaliar o estado do país. Nesta linha há aqui uma correlação inequívoca entre a democracia (participativa), a (má) governação e as enormes potencialidades logísticas e consciencializadoras das redes sociais, em que pontifica o Facebook. O mesmo que serviu de plataforma para mobilizar o 15 de Setembro e serve, doravante, para organizar o 29 de Setembro, de resto em comunhão com o que se passa em Espanha e Grécia, dado os problemas terem uma origem e consequências sociais comuns. 

O lema - "Que se lixe a Troika! Queremos as nossas vidas" - que serviu de guia de marcha para o protesto, encontra uma estreita relação com a realidade socioeconómica dos portugueses, uma relação expressa em números de adesão nas manifestações pacíficas que têm ocorrido nas ruas das cidades de Portugal, de norte a sul, do litoral para o interior. E com um comportamento exemplar por parte das forças de segurança,  talvez porque se identifiquem estruturalmente com a causa e as razões que dinamizam as manifestações. 

Naturalmente, os convites on line, via FBook são sempre muito superiores ao número efectivo de pessoas que depois se manifestam nas ruas. Ou seja, o "like" não encontra correspondência com a adesão efectiva nas manifestações. Recordo o caso da manif convocada para o Palácio da Ajuda contra o Acordo Ortográfico e em que cerca de 20 mil pessoas aderiram on line, mas nem meia dúzia compareceu no local agendado. Daí a reserva que importa ter entre o número de adesões virtuais e o número de pessoas que, efectivamente, vão às manifestações. 

Por outro lado, as revoluções são prévias às redes sociais, estas apenas as potenciam logisticamente. A Primavera Árabe foi, talvez, a onda de manifs mais expressiva dessa teoria neste novo milénio, que agora conta com uma fraternidade virtual sem precedentes. Dos cerca de 4,5 milhões de utilizadores inscritos no FB - só metade são utilizadores activos em Portugal, desenvolvendo esse novo espaço público (habermasiano) num espaço de maior intimidade pública para reflectir e agir sobre os problemas comuns na polis

Independentemente de as manifs serem enquadradas pelos sindicatos ou pelos partidos, a quem já ninguém liga, elas são hoje esmagadoramente participadas, porquanto a causa que as mobiliza é nobre, é legítima e fundada na razão e, ao mesmo tempo, serve como denúncia de más políticas públicas, erros de gestão, gestão danosa, corrupção e esbulho institucional por via fiscal, etc. 

Nesta perspectiva, a extensão do espaço virtual traz-nos, ao mesmo tempo, por um lado, mais liberdade - individual e colectiva - e, por outro, mais comunicação e interdependência, e é esta circunstância radicalmente nova que fragiliza o poder e os poderes públicos na sua globalidade, na medida em que os interroga permanentemente, questionado a legitimidade funcional das suas opções de política geral e medidas concretas e do sentido que ambas têm para resolver os problemas das populações. 

O 11 e o 29 de Setembro são, pois, marcos da expansão da democracia digital, da projecção da liberdade de expressão e de comunicação à escala europeia e mundial absolutamente sem comparação a tudo quanto autorizavam os media tradicionais onde pontifica a televisão. Esta potência civil que reorganiza a inteligência da acção colectiva, como a designa a melhor teoria dos movimentos sociais, favorece agora a emergência de comunidades em diversas áreas, de cuja acção resultam acções de cooperação ao serviço de ideias e de projectos mais competitivos e de optimização de recursos públicos e privados que dinamizam a economia e geram riqueza e bem-estar. 

Por outro lado, a noção de democracia, de direitos e de liberdades, que envolvem directamente a dignidade do cidadão, e a deliberação em tempo real que as redes sociais propiciam, facilitam também a produção de melhores leis e, portanto, de melhor justiça e equidade social.

Numa palavra, a democracia emergente, o ciberespaço compreendem uma nova ideia de liberdade de expressão e de relacionamento pessoal e institucional, por força de vivermos numa sociedade informacional, como designou M. Castells, pondo os cidadãos em contacto uns com os outros em maior número do que todos os media anteriores. 

Dito isto, permito-me concluir que entrámos numa época em que a democracia e as redes sociais vão gerar-se mutuamente num anel autocriador de que, primeiro, a comunidade militar foi pioneira, depois a comunidade científica internacional foi seguidora beneficiando o conjunto das sociedades civis por via do entusiasmo cooperativo do nosso tempo. 

Sempre que há uma grande manifestação em Portugal, especialmente quando a causa é nobre e legítima e alicerçada na razão, está tudo em aberto em relação à sociedade, à economia e à política. É por estas causas e efeitos que podemos afirmar que os destinos da democracia, da governação e das redes sociais estão cada vez mais ligados, pois ambos implicam aquilo que a humanidade tem de essencial: a aspiração à liberdade e à potência criativa da inteligência da acção colectiva em Portugal.



Etiquetas: ,

sexta-feira

Forma de resolver a crise em Portugal e dispensar a troika


NARRATIVAS DESESPERADAS: ESCAPATÓRIA DA TROIKA:

- Aproveitar a vinda do Papa a Portugal, "sequestrá-lo" (docemente) e pedir um resgate de 1 dólar a cada cristão e católico no mundo inteiro c/o forma de financiar o défice e libertarmo-nos da troika. 

- O dr. Soares seria o portar-voz não-oficial dessa reclamação planetária, dava-lhe mais protagonismo..

Nota: ouvida à saída da Basílica da Estrela. 

Etiquetas:

Breve Introdução ao Estudo do Direito - por Eurico Heitor Consciência -



Sinopse [link, Almedina]
                            _________________________________________________________________


Breves notas

Mão amiga, e fruto do acaso que só os deuses sabem explicar, partilhou esta obra de síntese que nos faz mergulhar nas normas e nos limites do Direito que fixa a vida do homem em sociedade. Esta pequena grande obra é uma eficiente introdução ao estudo do Direito: Breve Introdução ao Estudo do Direito, da autoria de Eurico Heitor Consciência, vale pelo resumo expositivo e pelas sábias referências aos autores que cita, de que apenas destaco o Prof. Castro Mendes que melhor conheço. 
Contudo, perguntamo-nos para que serve o Direito, se, hoje, como nunca, o grau de incerteza, imprevisibilidade e de impunidade são brutais no quadro das relações jurídicas, seja ao nível interpessoal, seja no plano institucional, tal é o grau de incumprimento que hoje conhecemos entre nós. Esta falta de eficácia no direito, e na justiça em moldes mais gerais, conduz-nos à descrença na justiça e nos seus agentes e instituições. Uma descrença que parece só encontrar paralelo na descrença profunda que os  governados têm pelos governantes no quadro do sistema político em concreto, e da governação em geral.
Seja como for, o autor, logo na pág. 13 da sua obra - que já vai na 5ª edição, sublinha um valor comum que urge sublinhar: a vida social exige regras ou normas de conduta que fixem limites às liberdades individuais - para ser possível a vida em comum: a liberdade de cada homem terminará onde começa a dos outros.
Talvez de forma mais impressiva, Sir Karl Popper, um dos maiores filósofos do séc. XX findo, disse o mesmo por outras palavras: a liberdade do meu punho termina onde começa a liberdade do teu nariz.
Parece, contudo, não nos restar outra opção, a fim de diminuir a imperfeição humana, ou aproximar mais o homem de Deus (segundo outros!!) senão enfatizar o valor dessas regras ou normas de conduta social, destinadas a resolver os conflitos de interesses dos homens ou promover a solidariedade dos interesses humanos, como alinha o autor, na pág. 14 desta Introdução ao Estudo do Direito. Daí a urgência no revigoramento do Direito, dos seus mecanismos coativos e, por extensão, na sua eficácia em nome do garantismo dos direitos, da paz social e do desenvolvimento económico.  
Na última Parte V - Direito Económico - o autor chama-nos à atenção para um conjunto de aspectos da nossa Constituição Económica e das formas que ela (ou melhor, o legislador) encontrou para se organizar e produzir bens e serviços em prol da comunidade que serve. Todavia, talvez não fosse desavisado integrar esse corpo útil de conhecimentos - que escapam ao "intervencionismo, dirigismo e planificação" do Estado (pág. 88 e ss.) - no âmbito da globalização económica, financeira e cultural que há muito desarticula as formas clássicas de intervenção do Estado - que já não é soberano - e que conta, hoje, com vários coletes de forças: a União Europeia, que dita o que devemos pensar e executar, ainda por cima no quadro duma Europa fragmentada por ausência de projecto solidarista (que existia ao tempo de Jacques Delors e dos grandes políticos europeus); e a globalização - enquanto decisor oculto mais vasto - determinado por tendências globais e globalizantes que sopram das áreas economicamente mais dinâmicas do mundo e que acabam por interferir com a vidinha desta nossa  pequena e comezinha polis.
Seja como for, impressiona a forma como o autor desta Breve Introdução ao Estudo do Direito, um sábio advogado, não se perde com elementos acessórios e vai direito aos temas essenciais e juridicamente relevantes.Talvez isso não ocorra por acaso, aliás, a sorte sempre deu muito trabalho. E para viver feliz, como diria alguém, é preciso aceitar as mentiras de todos, prestar-se ao seu jogo, rir às suas velhas pilhérias, divertir-se com as suas decrépitas brincadeiras, admirar-se com as suas ingénuas descobertas (..). É muito belo, eu o sei, erguer-se contra uma injustiça, denunciar um abuso, bater-se por um inocente, afirmar, contra o nosso próprio interesse, um princípio: isto te dará aplauso de algum solitário e descontente dispéptico; mas a sociedade nunca te perdoará (não cito pág., porque as edições de luxo nunca se citam, recordam-se, apenas..)




Afinal, o Direito não é uma ciência exacta, aliás, ele é, hoje, tão contingente (no diagnóstico e nos resultados) quanto a Economia, essa ciência da gestão das expectativas e das incertezas. Este talvez seja um dos grandes paradoxos do nosso tempo: quanto mais saber, tecnologia, experiência e sabedoria acumulamos, mais vulneráveis ao risco parecemos ficar. 

Daí a importância em respaldar o Direito noutras ciências ainda sem nome, ou mais ocultas, de que Pitigrilli foi, e é, um dos seus mais sábios cultores que aqui evocamos juntamente com a obra de Eurico Heitor Consciência. Na pior das hipóteses, quando se perde um caso, sempre podemos dar uma boa gargalhada e olhar pelo espelho retrovisor da vida e dizer que, afinal, valeu a pena viver todos estes anos - multiplicados pelas memórias que um dia ainda vamos contar, como legado...

Se não o fizermos por nós próprios, teremos a obrigação, ou melhor, o dever (kantiano) de o fazer pelos nossos pais, filhos e netos. É isso que os portugueses esperam dos portugueses de excepção. 

Etiquetas:

quinta-feira

Os jagunços do Coronel Ramiro e os jagunços pós-modernos

A diferença entre os jagunços do Coronel Ramiro, em a Gabriela de Jorge Amado, e os jagunços contemporâneos que protegem as soit-disant elites moribundas, reside apenas nas gravatas - que aqueles não usavam.

Etiquetas:

domingo

Homer Simpson vota em Mitt Romney - Irina Fernandes, JN

Nota prévia: Este arrependimento dá que pensar, sobretudo àqueles portugueses que votaram na actual coligação e há muito se encontram no estado de revolta mental a que chegou Homer Simpson. Medite-se nas razões deste arrependimento e tire-se as devidas ilações.



Com regresso marcado para o dia 30 nos EUA, a 24.ª temporada da série de televisão "Os Simpsons" aborda, pela segunda vez, a disputa à presidência entre o candidato republicano Mitt Romney e o candidato democrata Barack Obama.
foto DR
Homer Simpson vota em Mitt Romney
Homer Simpson é apoiante de algum partido político? A resposta é revelada naquele que será o primeiro episódio da 24.ª temporada da série de televisão "Os Simpsons", que vai para o ar no próximo dia 30 nos EUA.

O chefe da popular família amarela exerce o seu direito ao voto e assume a sua preferência política dando o seu voto a Mitt Romney. Mas, sem demora, arrepende-se da decisão tomada.

Logo após votar via electrónica no candidato republicano, Homer Simpson sofre na pele consequências do seu ato. É colocado a trabalhar numa fábrica, com sede na Ásia, onde é obrigado a cumprir trabalho na produção de material tecnológico. Mais: cansado de ser vítima de exploração na fábrica, atira-se de uma janela mas em vão, já que tem à sua espera uma rede anti-suicídio.
Esta não é, porém, a primeira vez que Homer Simpson exerce voto para eleições. Em 2008 cedeu a sua confiança a Barack Obama quando o democrata concorria às presidenciais contra John McCain.

Etiquetas: ,

sexta-feira

A situação política portuguesa e o síndrome de Estocolmo




É conhecida a trágica situação política, económica, financeira e social que Portugal e os portugueses atravessam: sem economia, sem sociedade, sem um governo credível, com as finanças públicas sempre desequilibradas em resultado dos desvarios dos sucessivos governos desde 1974, em que uns tiveram mais responsabilidade do que outros, mas todos, directa ou indirectamente, contribuíram para a gestão danosa do país, deficientes políticas públicas, elevados índices de corrupção, etc. 

Por outro lado, também não soubemos racionalizar os milhões que nos chegaram dos Fundos Comunitários que entraram em Portugal, muitos dos quais serviram para fazer estradas, escolas e hospitais, mas também serviram de justificação para abater as cotas de produção agrícola e escavacar as nossas pescas. De modo que hoje somos grandes importadores de bens, facto que nos torna dependentes do exterior. 

Esta dependência múltipla torna-nos hoje muito dependentes do Estado que, por sua vez, está mais imposteiro do que nunca, a ponto de asfixiar totalmente a actividade económica com impostos. Isto gera um estado psicológico particular entre os portugueses próxima do sequestro, dado que a maior parte da população está privada do acesso aos bens e serviços que teria numa situação de normalidade. Para agravar esta situação de elevada dependência do Estado e duma coligação de centro-direita que já provou não se entender nem saber governar, as vítimas, que são 10 milhões de portugueses, ainda que sintam essas privações de modo diferenciado em função dos seus rendimentos, tendem a identificar-se quer com o Estado - do qual dependem - quer com a própria coligação moribunda, dado que a convocação de eleições antecipadas por Belém é um cenário actualmente descartado, seja pelos custos dum acto eleitoral nesta delicada fase, seja ainda por uma questão de imagem internacional, mormente perante a Troika que não veria com bons olhos essa possibilidade. As tranches que faltam chegar aos cofres do Estado poderiam até ficar interrompidas no quadro da avaliação em curso até 2014. 
Isto confirma a analogia aqui desenvolvida que considera que Portugal vive, hoje, nos planos politico, económico, financeiro e social, o seu síndrome de Estocolmo. Dado que, apesar de tudo de mau que nos acontece, ficamos paralisados, pois temos de alinhar com aqueles que nos penalizam, ou seja, defender os próprios captores da nossa própria soberania (a troika) e subscrever as medidas de austeridade que este governo moribundo nos tem imposto, mesmo violando a doutrina e as interpretações do Tribunal Constitucional - que já considerou inconstitucionais o esbulho que o Governo de Passos Coelho e de Portas fizeram (e fazem) ao povo português, subtraindo-lhes os subsídios de férias, de natal, etc...
Não obstante este esbulho institucionalizado do Estado português, avalizado pela troika, os portugueses continuam a ter de alinhar com uns e outros (Governo e troika) para nos mantermos a respirar, ainda que a população tenha saído às ruas e chamado "gatunos" aos políticos que hoje mandam no país. 
Esta "identificação emocional" com os nossos captores, constitui, talvez, uma das maiores violências psicológicas que o povo português sofre desde a fundação da nacionalidade, no séc. XII. Mas temos de o fazer primeiro como dispositivo de defesa, e a medo, pois esta é a variável mais presente no sistema internacional explicitada por T. Hobbes, e que hoje revisitamos num país com mais de um milhão de desempregados, com inúmeras falências por dia, com uma brutal carga fiscal, em que o Estado e os seus agentes convidam os seus concidadãos a emigrar, coisa nunca antes vista por parte de titulares do poder político no activo. 
Neste quadro, até as tentativas de libertação se revelam perigosas para os 10 milhões de reféns - que hoje estão na paradoxal situação de ter de conviver com os nossos próprios carrascos por uma estrita questão de sobrevivência. 
Talvez a única diferença relativamente ao verdadeiro processo que levou ao síndrome de Estocolomo é que, neste caso, os 10 milhões de vítimas têm perfeita consciência do sequestro de que estão sendo alvo, sendo certo que muitos portugueses nem sempre conseguem fabricar uma estratégia ilusória para se proteger mentalmente do brutal sequestro financeiro, económico e social de que hoje todos somos vítimas neste imenso cativeiro que não sabemos quando termina. 
É por isso que estas notas são dedicadas às vítimas da troika, hoje dispersas um pouco por toda a Europa - perante uma Alemanha egoísta e cega que está a destruir o velho projecto solidarista da Europa enquanto casa comum de todos os europeus. 

Etiquetas:

quinta-feira

La voz que...

(..) pudo ser remedio...
y, por miedo, no fue nada

Etiquetas: , ,

Artigo de Boaventura Sousa Santos a ser publicado na revista Visão


  • A leitura da situação política de Portugal por Boaventura Sousa Santos. 




DOIS PERIGOS E DUAS SOLUÇÕES

Os dados estão lançados e não há como escapar à questão que levantam: Portugal é um negócio ou é uma democracia? Para o Governo e seus satélites, Portugal é um negócio. Pese embora o escândalo das contribuições para a segurança social (TSU), o confisco de mais um salário aos trabalhadores portugueses e a sua transferência para os patrões, o que de mais grave e irreversível está a acontecer diz respeito às privatizações e aos negócios internacionais que elas propiciam. O intermediário desses negócios chama-se António Borges, um agente opaco, como todos os agentes-sombra ou homens de mão. Ao contrário do que parece, não é um intermediário neutro e muito menos um zelador dos interesses nacionais. É um agente da Goldman Sachs com passaporte português. O seu negócio principal é venda de activos nacionais a preço de saldo, mas também está interessado em entregar à Monsanto a produção agrícola transgénica e a outras multinacionais, os recursos naturais do país. Se tiver poder e oportunidade, este homem causará imenso dano ao país.

Este é o primeiro perigo que os portugueses enfrentam. O segundo perigo é tentar neutralizar o primeiro através da demissão do actual Governo e da nomeação de um Governo de salvação nacional liderado por um tecnocrata, tipo Lucas Papademus ou Mário Monti. Os portugueses estão na rua depois do estado de choque em que mais uma dose das medidas de austeridade os mergulhou. Estão a ver, como já viram os gregos e os espanhóis, que essas medidas dão resultados opostos aos que proclamam e não oferecem outra alternativa senão mais medidas ainda mais gravosas. Em face disto, o Governo, com a sua indescritível insensibilidade social, dividiu o seu bloco de apoio e perdeu legitimidade perante os portugueses. O país pode em breve tornar-se ingovernável. Os portugueses estão numa situação de emergência que os pode colocar para além da divisão entre esquerda e direita, o que, sobretudo no contexto português, é preocupante. Perante isto, a tentação pode ser a de procurar garantir a estabilidade a todo o custo, recorrendo a um governo de salvação nacional. Não funcionará, como não funcionou na Grécia (na Itália ocorreu pré-troika e o resultado é incerto). O novo governo dará continuidade ao memorando da troika e os problemas de fundo voltarão com a mesma intensidade.

A solução para estes perigos tem de decorrer de dois exercícios normais mas exigentes das instituições democráticas. Quer queira quer não, o Presidente da República estará no centro de ambos. O de mais curto prazo tem a ver com o próximo orçamento que, se contiver as medidas anunciadas, é certamente inconstitucional. Compete ao Tribunal Constitucional fazer tal verificação perante uma solicitação de fiscalização preventiva. Se o TC decidir pela inconstitucionalidade, Borges, Gaspar e seus acólitos terão de prestar contas aos seus patrões internacionais mas os portugueses concluirão que é bom ter tribunais independentes e que isso só é possível em democracia. E ficará também patente que as instituições não se deixaram chantagear pelo golpe baixo da troika ao não ter disponibilizado a última tranche do financiamento até à discussão do orçamento, apesar de ter aprovado o desempenho do governo.

O segundo exercício são as eleições antecipadas. Pode levar mais ou menos tempo mas os portugueses devem ser chamados a pronunciar-se sobre a actual situação do país e as propostas de governação que forem submetidas ao sufrágio. Aliás, as instituições europeias vêem com preocupação o aumento da agitação social na zona euro e recomendam a renovação dos consensos. A própria troika reclama que o seu receituário deve contar com o apoio social. Existe consenso quanto à continuação da austeridade inscrita no memorando? Em democracia não há outro modo de o aferir senão através de eleições. Esta solução é particularmente exigente porque as eleições só fazem sentido se os partidos estiverem preparados para elas e tiverem soluções credíveis para o descalabro a que este Governo conduziu o país. Duas condições parecem indispensáveis. Por um lado, um entendimento de convergência com incidência pré- ou pós-eleitoral entre o PS, o BE e o PCP ou, se tal não for possível, entre o PS e um dos dois últimos. Por outro lado, bases programáticas de convergência que mostrem aos portugueses as possibilidades concretas de resgatar a dignidade do país. Por ironia, a segunda condição, sendo mais complexa, é a que avança mais neste momento, plasmando-se na ampla convergência de forças democráticas que sustenta o próximo Congresso Democrático das Alternativas e nas bases programáticas que dele podem surgir. Os partidos terão aí uma boa base de trabalho.

Ambos os exercícios pressupõem a desobediência democrática ao memorando da troika. Como tenho vindo a defender, a democracia portuguesa não sobreviverá ao cumprimento pleno dele.

Etiquetas:

terça-feira

Nuno Raimundo lidera investigação que pode travar surdez


FELICITE-SE NUNO RAIMUNDO POR ESTA INVESTIGAÇÃO QUE, A SER EFICIENTEMENTE CONCLUÍDA, IRÁ BENEFICIAR A QUALIDADE DE VIDA A MILHARES DE PESSOAS QUE, COM A IDADE, SOFREM COM A SURDEZ. ALÉM DE QUE É SEMPRE INTERESSANTE NOTAR QUE SÃO PORTUGUESES NA VANGUARDA DA INVESTIGAÇÃO - INTRA E EXTRA-MUROS. 

Segunda-feira, 20 de Fevereiro de 2012

Português lidera investigação que pode travar surdez

Português lidera investigação que pode travar surdez
Ao contrário do que se pensa, a surdez é reversível. É esta a conclusão de um estudo da Universidade de Yale, liderado por um investigador português, que desvenda o processo da perda de audição e traz a esperança de um tratamento para a surdez. O estudo foi publicado nas revistas “Cell”, “Nature” e “Science”.
 
Nuno Raimundo, bioquímico português de 35 anos que lidera a equipa de cientistas, explica à Lusa, que, na verdade, as células responsáveis pela audição “estão lá", "não estão a funcionar bem" mas "não estão mortas”.

Assim, nos testes feitos em ratinhos, a equipa conseguiu "manipular duas proteínas fundamentais farmacologicamente", dentro do ADN, e  reativar estas células, diz o cientista. 
 
Este estudo permitiu identificar várias moléculas importantes na surdez, entre as quais “Superóxido”, molécula que, ao ser removida, faz com que as células responsáveis pela audição não morram. Esta descoberta vem abrir “algumas janelas de possibilidade terapêutica. Pode vir a reduzir a incidência ou travar", diz Nuno Raimundo, à Lusa.
 
Nuno Raimundo pretende continuar investigações neste âmbito de modo a  "perceber exatamente quando algumas células [responsáveis pela audição] morrem, como morrem", explica à Lusa.
 
Apesar desta descoberta, estima-se que a criação de um tratamento para a perda de audição demore 10 anos no mínimo, visto que "do momento em que se identifica uma proteína ligada a uma doença até se conseguir acertar com o medicamento certo, as quantidades, tudo exige tempo", afirma Nuno Raimundo, à Lusa.
 
Nuno Raimundo está a estudar a surdez, em Yale, desde 2008. No futuro, pretende alargar a sua pesquisa a outras "doenças mitocondriais" e formar o seu próprio laboratório.
 
Clique AQUI para aceder ao estudo.

[Notícia sugerida por Patrícia Guedes e Raquel Baêta]

________________________________________________________________________________________-

Cell, Volume 148, Issue 4, 716-726, 17 February 2012
Copyright © 2012 Elsevier Inc. All rights reserved.
10.1016/j.cell.2011.12.027

Authors

Etiquetas:

domingo

Evocação de Tomas Tranströmer


Madrigal
(trad. de Luciano Mendes)

"Herdei um bosque sombrio onde raramente vou. Mas chegará um dia em que os mortos e os vivos trocarão de lugar. Então, o bosque se colocará em movimento. Não estamos sem esper
anças. Os crimes mais difícies continuam sem solução, apesar dos esforços de muitos policiais. Do mesmo modo, há em nossa vida um grande amor por solucionar. Herdei um bosque sombrio, mas caminho em um outro bosque, o luminoso. Todas as criaturas que cantam, serpenteiam, mexem a cauda e se arrastam! É primavera e o ar é muito forte. Tenho um diploma da universidade do esquecimento e estou tão vazio quanto a camisa que seca no varal.

Etiquetas:

sábado

Dar poder aos cidadãos - com responsabilidade, liberdade, dignidade


Em mais uma manifestação pacífica os cidadãos procuram organizar-se para dizer BASTA a um conjunto de aspectos da vida pública, da governação económica, financeira e social com as quais discordam frontalmente. 

Este é o tempo de os milhares de cidadãos em Portugal, enquadrados ou não por partidos ou em movimentos sociais, testarem o modelo de troca da sua intersubjectividade e, também por essa via, medirem os seus próprios limites à comunicação directa, embora depois a mesma seja mediatizada pela cobertura que tais eventos assumem no espaço mediático. 

Este também é o momento de essas "solidões organizadas", dentro e fora das redes sociais - ao nível das nossas sociedades e doutras que, nesta nossa Europa em pedaços, comungam dos nossos problemas, possam trazer soluções e propostas diferentes daquelas a que tem conduzido o actual e incompetente governo que rima com AUSTERIDADE = ESBULHO AOS RENDIMENTOS LEGÍTIMOS DO POVO PORTUGUÊS.

Poderá objectar-se: será mais um dia para extravasar emoções e sentimentos, libertar tensões, lamúrias e farpear a classe política que é considerada incompetente, corrupta, impreparada e socialmente insensível. 

Poderá ser assim, de facto, mas se admitirmos que estas manifestações, no plano imediato, nada resolvem, porque são vistas como utópicas, arruaceiras, enquadradas pelos sindicatos ligados, por sua vez, ao PCP (CGTP) e PS (UGT), essas manifestações têm o grande mérito de evitar que o gap entre os governados entre si aumente, i.é., que se limita o afastamento dos indivíduos com a sociedade e, por maioria de razão, com o Estado composto pelos dirigentes que, hoje, achamos impreparados, incompetentes e, alguns deles, imorais, de que o sr. miguel relvas constitui o exemplo mais execrável da vida pública nacional por razões conhecidas de todos.

Daí que estas manifs tenham inúmeras virtudes ao cimentar as pessoas em torno dum objectivo: Portugal e os portugueses, evitando o desfasamento entre o pensar colectivo e pulsar das suas populações e o agir que urge tomar em mãos. 

Este tipo de manifs são tanto mais necessárias quanto os cidadãos na Europa ocidental são, em matéria de informação, "anões" no domínio da acção mas são "gigantes" no domínio da informação a que vão tendo acesso, o que permite alargar consideravelmente o nível da percepção do mundo em que vivemos, sem, ao mesmo tempo, poder alargar, proporcionalmente, a sua capacidade de acção.

Esta manifestação, oriunda quase exclusivamente da insatisfação e INDIGNAÇÃO  da sociedade civil, é um sério contributo para alargar essa capacidade de acção, limitando cada vez mais o já exíguo espaço de manobra que o ainda governo de centro direita tem em Portugal. 

Todavia, a situação seria pior entre nós, como ocorreu durante quase meio século de ditadura, até Abril de 1974, se todos e cada um dos cidadãos não tivessem acesso livremente a essa superinformação, a qual nos dá a sensação e a vantagem de estarmos todos ao mesmo tempo a par dos problemas globais do mundo, ainda que tais problemas interfiram diferenciadamente em cada uma das nações de que somos parte, em resultado dos diferentes níveis e ritmos de desenvolvimento, crescimento e modernidade perante os fluxos globais gerados pela globalização. 

- Quer dizer, a situação seria francamente pior se o cidadão, como no passado recente, não apenas não tivesse grande capacidade de acção como estivesse, além disso, isolado do mundo. Hoje, esta capacidade activa que temos em procurar a informação, para a organizar, racionalizar e comunicar, evita que o cidadão esteja completamente perdido e dominado por classes políticas corruptas, incompetentes e impreparadas que nunca deveriam ter chegado ao poder. 



Etiquetas: , ,

quinta-feira

Xeque mate de António José Seguro a Passos Coelho



Tó Zé Seguro, num discurso curto e incisivo, cortou a direito e lançou um XEQUE MATE ao PM mais incompetente e imoral que deixou de ter condições objectivas e subjectivas para governar, não obstante a maioria parlamentar de centro-direita..

- Parabéns a Seguro. Esperemos que Portugal ganhe algo com isto.

Etiquetas:

Uma nova UTOPIA para o dia 15 de Setembro: sonhadores que pensam e pensadores que sonhem


Portugal está num carrefour perigoso, pois para milhões de cidadãos o projecto ultraliberal segundo o qual o Ocidente estaria apto para viver em condições de liberdade absoluta, com elevados padrões de vida, é tão irreal quanto dogmático - como a própria ambição revolucionária de pendor socialista assente no igualitarismo absoluto. Nenhum desses projectos foi, é, realista. A  história do séc. XX e a deste 1º decénio do III milénio demonstram-no. 

Daí os milhões de portugueses, e de cidadãos europeus em geral, se interrogarem acerca do melhor modo de organizar a economia e a sociedade, ou seja, de conceber os fins da política que procuram exprimir através duma nova utopia, qual racionalização do futuro e do mundo. A austeridade galopante nas finanças públicas em Portugal e, de forma sistemática, o desnorte dum governo neoliberal é bem disso evidência. Daí a necessidade duma profecia política em Portugal, um novo projecto de futuro que reconcilie a sociedade consigo própria e com o Estado, que hoje apenas se comporta como um rufia e assaltante de bairro que esbulha os pobres para dar aos mais abastados, muitos dos quais montados no próprio aparelho de Estado e nas suas dependências orgânicas.

A questão que se coloca neste colete-de-forças é, pois, saber se que haverá espaço político e ideológico para recriar a nova utopia sobre os escombros da barbárie neoliberal?!

Especialmente, se se considerar que existe uma tremenda desconfiança entre governantes e governados, entre as supostas elites e as massas, o que dificulta a estruturação dos grandes projectos político nacionais que nos façam sair do ciclo de pobreza estrutural em que caímos. Desconfiança, sublinhe-se, que também alastra ao imenso descrédito das elites tecnocráticas e à relação das populações e da opinião pública com os media, que são empresas com interesses corporativos muito marcados na sociedade e na economia e, não raro, têm também projectos de poder ou de facilitação de captura de poder em relação a certos players.

Ante isto, os portugueses organizam-se dentro e fora das redes sociais, já convocaram uma manifestação para dia 15 de Setembro a fim de contestar esta nova velha ditadura das finanças imposta por um governo, e um ministro das finanças, completamente insensível às pessoas e aos seus problemas sociais. Enfim, será mais uma manifestação oriunda da sociedade civil em que os homens e mulheres de Portugal irão mostrar que querem apenas introduzir entre nós um pingo de humanidade nesta triturante máquina neoliberal que tem usado e abusado da carga fiscal sobre os portugueses, esbulhando-os descaradamente, procurando um compromisso socialmente responsável que dê uma réstia de esperança a jovens e idosos, hoje condenados a emigrar ou a viver da esmola da sociedade.

Serão, creio, essas angústias e inquietações que irão estar em debate, mesmo que o poder em Portugal se tenha tornado num poder cego, ávido dos recursos alheios que retem indevidamente a quem trabalha e produz. E faz tudo isso em nome dum projecto e duma terapia falhadas, que agora é revisitado pelos mesmos players por força da obsessão, impreparação e incompetência dos actuais titulares dos principais cargos políticos da nação. 

Penso, contudo, que a manifestação de 15 de Setembro procurará respostas para estes legítimos anseios mas, de novo, baterá com a cara na parede perante os complexos problemas sociais, económicos e financeiros com que está confrontada. Problemas esses que são endógenos e que se agravam com uma Europa moribunda que há muito deixou de ser um projecto solidarista e passou a ser aquilo que eram os velhos directórios nos sécs. XIX e XX, marcado por guerras de conquista.

Tenho para mim que no dia 15 de Setembro de 2012, cada um dos homens e mulheres experimentará um momento ao mesmo tempo singular e comum de raiva contra um poder cego, incompetente, amador, imoral, insensível e lutará contra um projecto ultraliberal que não faz sentido e, em contrapartida, apresentará uma resposta global que se possa opor o modelo político dominante assente na financeirização da vida política nacional. Projecto esse  já criticada pela própria troika, que compreendeu que mais austeridade sem coesão social e crescimento levará à desgraça colectiva.  

Ora, é para dar corpo a este novo projecto social, que não é fácil, dado buscar uma ideia de progresso e de crescimento constante e sustentável hoje problemático, que, mais do que os economistas e os tecnocratas, são necessários novos homens para escaparmos deste naufrágio em curso. Esses novos homens serão os sonhadores que pensam e os pensadores que sonham, sem eles dificilmente a sociedade portuguesa conseguirá reencontrar o projecto social que precisa para o nosso desenvolvimento colectivo. 

Para esta tarefa não são apenas necessários boa vontade e capacidade de mobilização, urge também encontrar novos conceitos, uma "ideologia" mais amiga das pessoas (e que as sirva e não se sirva delas através do esbulho do Estado por via fiscal). Conceitos emergentes enquadrados por uma nova ideologia é, talvez, o que Portugal e os portugueses precisam hoje para a arquitectura dos seus sonhos, ideias e projectos de vida em sociedade. 


Etiquetas:

quarta-feira

Quando a bota não bate com a perdigota. Ainda o relvas affair

Imagem picada no Jumento


Quando o sr. relvas emite o que quer que seja - intra ou extra-muros - para a esfera pública nacional está só a dar tiros nos pés, pois perdeu toda a confiança da população que já tem anti-corpos relativamente ao personagem.

- Mal comparado, é como pedir a um mafioso que leve os nossos filhos à praia; pedir a um juiz corrupto que atribua uma pena de prisão ao seu filho no quadro de um julgamento por tráfico de droga; ou ainda entregar uma colónia de férias à guarda de pedófilos.

- Há coisas, pela sua própria natureza, em que "a bota não bate com a perdigota", pelo que haveria vantagem em alguém com bom senso explicar estas regras simples de comunicação ao personagem visado.


Etiquetas:

O isolamento de Passos Coelho no partido, na sociedade, na economia e no Estado



O ISOLAMENTO DE PASSOS COELHO - NO PARTIDO, NA SOCIEDADE, NO PORTUGAL PROFUNDO


Não há um empresário que se solidarize com a gestão da coisa pública feita pelo ainda PM;

- De todos os seus ministros, só o das Finanças é que o suporta, por 
ser o autor material dos erros em catadupa cometidos, dada a impreparação do PM na área e do experimentalismo daquele em matéria de finanças;

- O seu colega da coligação, PPortas, aposta no desgaste de Coelho para mais rapidamente se livrar no poder, por isso viaja incessantemente;

- A igreja, os sindicatos, as universidades e as corporações em geral já há muito que perderam a confiança no PM;

- A JSD, essa ficção de jovens de pensamento autónomo dentro da máquina laranja, que existe em todos os partidos para servir de escola e viveiro de quadros políticos, já se rebelou, ou simulou esse efeito para demonstrar a fúria dos jovens perante o esbulho anunciado constante nas medidas previstas para OGE/2013;

- Os jornalistas não o gramam, até porque um dos seus ministros, hoje um nado-morto que se tornou a chacota nacional (e além-fronteiras, até em Timor-leste..), chegou a chantagear um jornalista no intuito de condicionar o exercício da sua profissão e liberdade de pensamento e de expressão;

- Belém - já soltou os seus "buldogues" - e há dias Alexandre Relvas (do inner circle de cavaco) deu um ar da sua graça ao farpear o Gov criticando-o de "experimentalismo social";

- O bispo dos militares, D. Januário lidera uma importante facção da oposição informal em Portugal, gozando do silêncio engagé da igreja, que também não o hostiliza pelas suas declarações públicas. O que significa que, oficiosamente, a igreja respalda as posições do bispo corajoso.

- Neste quadro negro - quem apoia Passos Coelho??
- A Srª Laura de Massamá?
- O relvas da concessão da RTPúm?

Passos coelho é, hoje, sem qualquer sombra de dúvida, um homem isolado, já não só no seio do seu próprio partido, como na sociedade e no Portugal profundo. 

- Isto, assim, só pode acabar mal.

Etiquetas: , ,

segunda-feira

Evocação de Guerra Junqueiro e a nossa decadência lusitana


  • Dirigido à troika e aos dois partidos da coligação (contra-natura, psd e cds) que ratificam hoje, vezes sem conta e de forma contraditória, a humilhação por que Portugal e os portugueses atravessam. Enfim, um retrato do Portugal do séc. XIX - mas que espelha eficientemente aquilo em que nos fomos tornando neste 1º quartel do séc. XXI. 




EVOCAÇÃO DE GUERRA JUNQUEIRO:

Um Povo Resignado e Dois Partidos sem Ideias



Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta. [.]

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País. 

A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas. 

Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar. 

Guerra Junqueiro, in 'Pátria (1896)'

Etiquetas:

domingo

A anomia portuguesa. Evocação de Emile Durkheim e a luta sem massa, projecto sem finalidade




- Com um milhão (ou mais) de portugueses desempregados, os que não estão passam recibos verdes com a precariedade conhecida;

- Com a hegemonia de algumas corporações que comandam o sentido da marcha legislativa e telecomanda o escol dirigente que na AR faz as leis mais convenientes para servir esses interesses corporativos;
- Com dezenas de milhar de pessoas qualificadas e em idade jovem e activa a emigrar compulsivamente, porque em Portugal só se deparam com falta de oportunidades;
- Ficam, apenas, aquelas classes sociais que já vincularam ao Estado e, por isso, falam hoje de cátedra, mas são incapazes de ir além da mera opinião inconsequente; os grandes empresários sempre imunes às crises, ainda que percam milhões com elas; as classes liberais que já granjearam sucesso na sociedade. 
- Quem verdadeiramente sofre com este tipo de esbulhos fiscais são a classe média e as classes abaixo dela: a média-baixa e a baixa - que apenas tem o suficiente para não morrer à fome.

Ante este quadro social depressivo, que potencial de luta se vislumbra nos portugueses para combater - nas instituições e nas ruas - as medidas fiscais ultra-liberais e neocorporativas de que tem sido objecto no último ano e meio? 

O cenário é, de facto, desolador por razões básicas: os que emigram não estão cá, e os seus amigos e familiares não se mobilizam para o efeito; aqueles que comem certinho à manjedoura do Estado (e falam de barriga cheia para mostrar que integram a classe dos oprimidos espelham a sua própria hipocrisia) - mas nada mais fazem senão debitar um opinanço de sebenta que já enjoa; os empresários de sucesso deslocalizam capitais e têm o mundo na palma das mãos; os grandes escritórios de advogados continuam a facturar milhões por ano com avenças deste e doutros governos (pretéritos e futuros, como sempre foi e será em Portugal); a corrupção política-empresarial-autarquica continuará a dar cartas, ainda que o país conte com uma procuradora-geral adjunta que denegue os factos por mera lógica corporativa e de ambição de carreira.

Estes factos somados levam-nos, inevitavelmente, a uma conclusão: os portugueses estão falhos de objectivos, não têm, de facto, verdadeiros instrumentos de luta contra as injustiças sociais, o que é gerador da perda de identidade, o que provoca, por sua vez, transformações no mundo social português que o descaracterizam ainda mais. 

De notar, conforme estudos recentes, que Portugal poderá perder 1 milhão de pessoas até 2020 em resultado desta recessão, o que é preocupante em todos os níveis... E é este capitalismo de casino (que "mata" a natalidade), ratificado pela Europa de Merkel, de que Passos Coelho é um fiel e obediente discípulo, que ajuda a explicar a ruptura com os valores tradicionais do passado, ligados à sua forma de organização social, económica e à sua concepção religiosa. 

De resto, pergunto-me o que significa hoje ser católico em Portugal? Esta é a anomia que vivemos, para evocar o criador do conceito e o "pai" da Sociologia moderna, Emile Durkheim. 

Com efeito, o paradoxo do nosso tempo é, de facto, bizarro, pois os processos de mudança sociais, o racionalismo, as mutações tecnológicas, a evolução do quadro de mentalidades, tudo isso, deveria potenciar novos valores sociais que permitiria uma ascensão social da generalidade das camadas da população, que viveria melhor do que seus pais e avós, mas parece, em pleno III milénio, registar-se um retrocesso neste capítulo. Um retrocesso mitigado por um sentimento difuso de andar à deriva, agravado por um governo de gente pouco qualificada e recomendável que acaba por induzir ainda mais esse sentimento, apresentando medidas num e noutro sentido, nas mais variadas áreas da governação, que só confunde mais os portugueses. 

Na realidade, não se pode governar com base em mentiras e em testes para detonar reacções sociais para, depois, o Governo reagir em conformidade com essas reacções. O "medo" não pode ser a variável que determina a marcha do governo, ante a sua falta de visão, desígnio e objectivos para Portugal, hoje um miserável protectorado da troika.

No limite, e para retomar a terminologia de Durkheim, até apetece perguntar se os portugueses não se sentem, no plano colectivo, a vivenciar uma espécie de suicídio assistido perante um governo totalmente incapaz e uma troika verdadeiramente controladora e impositiva do que se deve (e não deve) fazer na governação em Portugal. Tudo com a aquiescência do governo, mas com a total oposição do Portugal profundo. 

Esta anomia, ou melhor, esta incapacidade de atingir os objectivos gerais das populações, até por parte dos novos movimentos sociais formados e articulados nas redes sociais, que apenas têm um poder mobilizador e protestaivo, mas que depois não encontra quaisquer consequências institucionais e nas suas vidas concretas, é revelador da disfunção entre o poder político e a sociedade, aumentando o fosso entre governantes e governados, o que tende a gerar uma patologia social que terá, seguramente, diferenciadas consequências em cada um dos indivíduos, que são sempre desiguais entre si. E alguns, como temos tido conhecimento, não sucumbiram ao suicídio que acabou por funcionar como terapia salvífica duma situação económica degradante, que, com Pedro passos Coelho, tenderá a agravar-se. 

Estes factos, e as preocupações a eles associados, geram inevitavelmente um Portugal diferente: mais velho, mais perigoso, mais imprevisível, mais permeável ao risco, mais criminoso, mais desigual, mais injusto, mais auto-destrutivo, enfim, mais violento e permeável aos desvios vários que, na prática, só têm o seu equivalente funcional nos desatinos dum Governo neoliberal e corporativo que viola a Constituição da República Portuguesa, esbulha os mais pobres para deixar os mais ricos na mesma. Tudo para atingir os seus propósitos orçamentais e equilibrar as finanças públicas. E o que vemos do lado da despesa do Estado?!

Esta insensibilidade social gritante é, nos tempos que correm, um acto verdadeiramente criminoso, e alguém terá de responder pelas suas consequências. 



Etiquetas: ,